Conselhos para um jovem médico – Capítulos 13, 14 e 15

CAPÍTULO 13: COMO ACHAR UM MENTOR

“Se queres saber o que vem pela frente em tua estrada, pergunte a quem já fez esta viagem e retornou”

(provérbio Chinês).

Um dos pontos mais importantes na carreira do jovem médico é encontrar mentores. Entendo como mentor todo o indivíduo que em qualquer momento da carreira de um aluno ou jovem médico possa lhe dar algum conselho ou orientação. Reservarei o termo orientador para o indivíduo que orientará formalmente um médico já formado para a elaboração de sua dissertação de mestrado ou doutorado, ou seja, em sua pós-graduação strictu sensu. O Orientador, então, será também sempre um mentor.

O mentor é geralmente é um médico mais experiente e acessível e pelo qual temos admiração. Muitas vezes nosso mentor pode ser um residente ou um jovem assistente com alguns anos a mais de experiência além da que já temos. Nossa admiração pelo mentor pode ser resultado de sua didática, de seu cuidado e carinho para com seus pacientes, de sua inteligência e criatividade, de sua produtividade científica ou ainda de sua capacidade administrativa e gerencial. Como precisamos de orientação em uma ou mais dessas áreas, poderemos ter um ou mais mentores para cada uma dessas atividades em um dado momento. É imprescindível também que exista afinidade mútua pois da relação mentor-aluno, freqüentemente, se originará uma amizade duradoura. No início de nossas carreiras não entendemos claramente porque encontramos com relativa facilidade sempre alguém para nos orientar. Com o passar dos anos, percebi que ser escolhido como mentor é talvez a mais nobre e enriquecedora experiência da vida acadêmica, o que explica o porquê, no contexto universitário, da existência de vários indivíduos disponíveis para se tornarem mentores.

Precisamos sempre identificar possíveis mentores para nos orientar em relação às nossas necessidades de desenvolvimento profissional em áreas nas quais sejamos ainda iniciantes e, algumas vezes, nas áreas que já julguemos dominar bem. Entretanto, eu diria que sempre que buscarmos um conselho de alguém que julgarmos mais experiente em uma dada área, estaremos buscando um orientador. Por exemplo, mesmo sendo um especialista, eu gosto de discutir casos difíceis com outros colegas. Apesar de não ser considerada uma relação clássica de orientador-aluno, a discussão de casos difíceis com um colega ou com um grupo de especialistas é também, a meu ver, um tipo de orientação muito útil. Na área científica, eu creio, é mais difícil se identificar um mentor pois raramente temos uma exposição prévia ao seu trabalho sem que façamos um estágio em seu laboratório. Para alunos de medicina e médicos recém formados é difícil de imaginar através apenas dos trabalhos publicados de um dado cientista como é que seria tê-lo como um mentor ou orientador. Já na área clínica, ao vermos o professor trabalhando (operando, visitando a seus doentes, etc), sentimos seu estilo de trabalho e personalidade com muito mais transparência.

Pós Graduação Strictu Sensu e tipos de Orientador

Infelizmente, nem todas as Faculdades de Medicina treinam a capacidade reflexiva do estudante e nem lhe fazem participar de projetos de pesquisa nos quais ele possa participar da geração de conhecimento médico. Assim, a maior parte dos alunos sai da Faculdade sem ter participado de nenhuma atividade de pesquisa para fazer uma residência em uma dada especialidade que, por sua vez, na maioria das vezes lhe proverá também apenas com habilidades de ordem prática, necessárias ao exercício da especialidade escolhida. Apesar da residência ser também uma forma de pós graduação (que denominamos latu sensu), não há um compromisso de que se desenvolver no residente uma atitude reflexiva em relação ao conhecimento médico. Portanto, o médico pode passar pela faculdade e residência e entrar no mercado de trabalho como um mero repetidor do que se lhe inculcou durante sua formação, sem que ele possa refletir criticamente sobre o que aprendeu, nem muito menos com a capacidade selecionar criticamente novos conhecimentos para se atualizar.

Ficou pois delegado à pós graduação strictu sensu (programas de doutorado e mestrado), o desenvolvimento da habilidade crítica de reflexão e de pesquisa para gerar novos conhecimentos na área médica. Como resultado, para formação de um médico com título de doutorado, ou seja, capaz de passar a coordenar projetos de pesquisa independentemente e de orientar outros pós-graduandos podemos necessitar de cerca de 8 a 12 anos de estudo após o término da Faculdade para incluir a residência, mestrado e doutorado.

O primeiro passo para iniciar um programa de pós graduação strictu sensu é terminar uma residência e escolher um orientador e um projeto de pesquisa. Discutiremos a estrutura de um projeto de pesquisa futuramente. A escolha do orientador poderá depender de vários fatores como, por exemplo, afinidade mútua, interesse pela sua área de pesquisa, entusiasmo científico e quantidade de publicações em revistas indexadas do futuro orientador. É fundamental que se escolha bem o orientador. Creio, aliás, ser muito mais importante a escolha de um bom orientador, mesmo que, a princípio, não tenhamos muita afinidade com a sua área de pesquisa. A pós-graduação é uma oportunidade de se apreender a metodologia de pesquisa, que se adquire independentemente da área de pesquisa escolhida. Após concluirmos o doutorado poderemos, com os conhecimentos metodológicos obtidos, nos engajar em qualquer outra área de pesquisa que nos fascine.

A escolha dos créditos a serem feitos será aconselhada pelo orientador mas, sempre que possível, sugiro escolher créditos na áreas de bioestatística, didática, medicina baseada em evidência, pesquisa bibliográfica e redação científica. Estes são conhecimentos de extrema utilidade para um futuro pesquisador e geralmente são pouco enfatizados nas escolas médicas e programas de residência.

Na minha experiência na pós-graduação strictu sensu, percebi que existem alguns modelos básicos de orientador: 1) O que ajuda muito e orienta pouco: este orientador provê todo o material para a pesquisa, ajuda a obter tudo o que for necessário para desenvolver um dado trabalho, inclusive indicando outros cientistas para nos ajudar em determinadas etapas mais difíceis. Não espere que este orientador sente muitas horas com você. Ele irá, todavia, ajudar você nos momentos mais cruciais, iluminando o seu caminho com idéias práticas para que você conclua com sucesso a sua tese. Ele permite que você ache seu próprio caminho, respeita suas opiniões e desperta em você sua capacidade de reflexão; 2) O perfeccionista que orienta muito: fuja dele. Este tipo de orientador tornará sua vida impossível. Você deverá repetir incontáveis experimentos ou incluir cada vez mais pacientes no estudo. Não há fim para os trabalhos que sempre se prolongam além do esperado. Ele não deixa que você pense e muitas vezes não respeita suas próprias opiniões. A tese é concluída, geralmente, por um ultimato do próprio aluno desesperado com um prazo inadiável. O lema deste orientador é que não há tese sem sofrimento e a frase que ele deveria apreender é que o perfeito pode ser inimigo do bom; 3) O que ajuda e orienta: este orientador é uma raridade. Se o achar, cole nele. É difícil descobrir de antemão como será um dado orientador. Uma dica importante. Pergunte aos seus atuais orientandos como ele é na vida prática e, na dúvida, trabalhe em algum projeto menor com ele antes de oficialmente escolhê-lo para ser seu orientador.

A meu ver, o papel do orientador é despertar a capacidade reflexiva do orientando, estimular sua criatividade e dotá-lo de sólida metodologia científica. O orientando deverá também apreender a escrever, apresentar e defender seus dados. A pós-graduação strictu sensu tem um papel multiplicativo, pois um novo doutor poderá formar vários outros no decorrer de sua vida, o que nos motiva a orientar especialmente médicos que irão para cidades com ainda um menor número de médicos pós-graduados. A meu ver, a pós-graduação strictu sensu é essencial para a completa formação do médico e deve ser perseguida com especial ênfase no início da carreira médica. Após alguns anos de formado, responsabilidades familiares e pessoais tornam mais difícil a dedicação a um projeto de pesquisa.

CAPÍTULO 14 – COMO FAZER UM PROJETO DE PESQUISA

É através do método experimental que se faz com que a ciência progrida e não ao aceitar sem crítica a autoridade de fontes acadêmicas ou eruditas. No método experimental a realidade observável é nosa única autoridade.

(Claude Bernard. Introdução ao Estudo da Medicina Experimental).

O desejo ardente por conhecimento é o único motivo que atrai e dá apoio a investigadores em seus esforços. E justamente este conhecimento, realmente conquistado, mas que sempre lhes escapa se converte de imediato em seu único tormento e sua única felicidade… Um homem de ciência se eleva sempre ao buscar a verdade; e se ele nunca a encontrar em sua forma plena, ele descobrirá, todavia, fragmentos muito significativos dela; e estes fragmentos da verdade universal são o que precisamente constitui a ciência (Claude Bernard. Introdução ao Estudo da Medicina Experimental).

Não existem temas esgotados, mas investigadores esgotados nestes temas (Santiago Ramon y Cajal: Conselhos ao Jovem Investigador).

Caro leitor, chegamos ao ponto crucial da carreira acadêmica que é a produção de conhecimento e formação de novos pesquisadores. Só podemos gerar novos conhecimentos a partir da pesquisa, seja ela básica (em áreas como bioquímica, fisiologia, biologia molecular, fgarmacologia, etc) ou na área clínica, através da condução de estudos clínicos.

Como vimos em cartas anteriores, precisamos primeiramente escolher um mentor e, se estivermos oficialmente aceitos em um programa de pós-graduação strictu sensu, de um orientador. O tema a ser pesquisado, como já sugeri anteriormente, deverá no início, preferivelmente, nos ser dado pelo próprio orientador. Acredito que nos inserindo de imediato na linha de pesquisa do orientador, poderemos contar com o seu conhecimento e experiência já adquiridos neste assunto obtidos ao longo de sua carreira científica e do constante intercâmbio que ele mantém com outros pesquisadores dedicados à mesma área de estudo. Além disso, ao nos dedicarmos à mesma linha de pesquisa do nosso orientador, teremos também uma maior chance de estarmos nos direcionados por ele a responder uma pergunta experimental ou clínica pertinente, através de uma metodologia adequada. Além dos argumentos citados, o orientador já conta, geralmente, com verbas especificamente alocadas para desenvolvimento de sua linha de pesquisa. Portanto, insumos e equipamentos necessários para a condução de um projeto de pesquisa que ele nos sugira, estarão geralmente já disponíveis para nosso uso.

Feitas estas considerações, seria também inútil imaginar que um pesquisador já estabelecido, abarcará uma nova área de pesquisa somente para orientar a um novo aluno. Portanto, devemos, a meu ver, redimensionar nossas expectativas e, ao invés de buscar sozinhos um tema que julguemos ser para nosso primeiro projeto, devemos encontrar inicialmente um bom orientador e aguardar que ele nos oriente nesta escolha de um tema para o nosso primeiro projeto de pesquisa. É óbvio que a partir do primeiro trabalho, os demais projetos já poderão e deverão contar com as idéias do aluno que, agora, passa também a participar ativamente da concepção e condução dos novos projetos como membro ativo do time de pesquisa do orientador.

Muitas vezes, o orientador, muito ocupado, nos direcionará a um membro de sua equipe, geralmente menos experiente, mas com mais disponibilidade de tempo para nos ajudar. Aceite um conselho, caro leitor, torne-se um bom amigo deste indivíduo ajudando-o em parte de suas próprias funções, aprendendo com ele os meandros do trabalho clínico ou experimental, o funcionamento do ambulatório ou do laboratório, enfim, as regras de sobrevivência na sua nova selva. Outro conselho, procure não dar a este seu preceptor nenhum trabalho adicional, ao contrário, como falamos acima, ajude-o em seu próprio trabalho para que lhe sobre tempo para que ele possa lhe ensinar.

Lembre-se de outro conceito fundamental. O pesquisador procura sempre a verdade. Você pode trabalhar anos e não descobrir nada de útil para a medicina. Porém, se você fez e respondeu perguntas pertinentes através de uma metodologia experimental adequada, isto já lhe garante o aprendizado das habilidades científicas experimentais ou de pesquisa clínica básicas necessárias para pleitear um título de mestre ou doutor. A publicação e apresentação destes resultados em congressos científicos, mesmo que os resultados sejam negativos, em nada diminui o valor de seu trabalho. Portanto, somente interessa ao bom pesquisador que suas hipóteses sejam provadas ou descartadas através de dados confiáveis, obtidos através de seu esforço experimental ou clínico bem orientado. Muitas vezes, orientando a alunos, percebo que, quando da análise dos dados obtidos, uma certa decepção por não terem comprovado uma dada hipótese, formulada antes de se obter os dados. Nestes casos, ao esboçarmos as conclusões do trabalho, negamos a procedência da hipótese que motivou o próprio trabalho. Ora, não há motivo para decepção, explico aos alunos. Provamos algo, afinal. Com base em dados de boa qualidade, respondemos, ainda que da forma não inicialmente esperada, a uma pergunta e avançamos, assim, em nosso conhecimento do assunto. Todos os alunos envolvidos no projeto apreenderam, através da coleta e análise dos dados, os princípios da boa ciência que se preocupa menos com o que se queria provar, mas sim com simplesmente poder provar ou descartar uma hipótese de maneira clara e com base em dados de boa qualidade.

Estrutura do Projeto de Pesquisa

Invariavelmente o programa de pós-graduação ou mesmo uma agência de fomento à pesquisa (para a qual você ou seu orientador esteja pleiteando uma bolsa) lhe pedirá para redigir um projeto de pesquisa, ou seja, registrar por escrito e de forma estruturada o seu plano de pesquisa. Ainda que discutamos brevemente a seguir a estrutura geral de um projeto de pesquisa – precisamos sempre adequar esta estrutura aos requisitos do programa de pós-graduação ou aos da agência de fomento à pesquisa – nada substitui você pedir para seu orientador para analisar um projeto de pesquisa já finalizado que sirva como um modelo para o que você irá fazer.

Um projeto, assim como um artigo científico, conforme descrevemos anteriormente, deverá ter um título, um resumo, uma introdução, uma sessão de metodologia, resultados preliminares (se já existirem), um cronograma de trabalho, trabalhos prévios do orientador e/ou aluno na linha de pesquisa na qual o porjeto em questão esteja inserido e referências bibliográficas. Não se pode esquecer também, em trabalhos com seres humanos, que os projetos correspondentes devem antes passar por um comitê de ética em pesquisa institucional. Da mesma forma, trabalhos que envolvam animais devem também ser aprovados por um comitê específico. A seguir, brevemente, descrerei de forma geral cada um dos itens itens que compõem um projeto de pesquisa.

1) Título: deve ser o mais breve e claro possível. Se usarmos abreviaturas, devemos se, possível, tê-las entre parênteses, após as termos descrito por extenso. Creio também ser interessante um título que sumarize o objetivo principal do estudo. Por exemplo: Estudo de fase II da combinação de quimioterápico Topotecan, Ara-C, Cisplatino e Solumedrol (TOPOSHAP) para resgate de pacientes com Linfomas recidivados ou refratários. Este Título é claro e sumariza o tipo e objetivo do estudo em questão.

2) Resumo: o resumo do projeto de pesquisa deve imitar, a meu ver, a estrutura do projeto como um todo, mas de forma muito mais objetiva e sucinta. O texto do resumo deve ser também muito claro. Nas frases iniciais do resumo, em caráter introdutório, devemos ressaltar a importância do tema de pesquisa em geral e, dentro deste tema, demonstrar quais são e o porquê da escolha dos objetivos do projeto em questão. Devemos lembrar que muitas vezes quem avaliará inicialmente nosso projeto pode não ser um experto nesta área particular de pesquisa, de forma que devemos sempre fornecer, de forma sumária fatos e dados nesta parte introdutória do resumo que permitam mesmo a um não especialista neste assunto a compreender porque escolhemos os objetivos do projeto. É interessante se for pertinente, citar nestas frases introdutórias dados já obtidos e publicados anteriormente pelo grupo do pesquisador que é o autor do projeto. Após explicitarmos os objetivos (que eu recomendo que se restrinjam a 3 no máximo), mencionaremos brevemente e em linhas gerais qual será a metodologia experimental empregada, sem detalhá-la além do necessário para que o leitor possa claramente identificá-la e poder julgar se é adequada. Devemos aqui mencionar quantos sujeitos serão envolvidos na pesquisa e, se estivermos tratando de pacientes em um protocolo clínico, temos que citar quais os seus critérios de inclusão e exclusão para participação no estudo. Se houverem dados preliminares, seria interessante mencionar seus resultados brevemente neste ponto, logo após a descrição da metodologia. Enquanto mencionaremos sempre os eventuais dados experimentais preliminares no tempo passado, a metodologia do projeto deverá sempre ser escrita em tempo futuro, tanto no resumo como no projeto principal. Uma boa dica para o resumo e para o projeto como um todo é pedir para que seja lido por outros colegas para que possíveis pontos que necessitem de maior clareza possam ser mudados antes de se submeter o projeto.

3) Introdução: a introdução do projeto funciona como uma revisão da literatura e deve seguir estruturalmente, em linhas gerais, as frases introdutórias do resumo, como se estas frases se constituíssem em títulos de subitens para serem desenvolvidos mais extensamente nesta parte do projeto. No desenvolvimento de cada uma das partes (subitens) da introdução devemos nos servir de citações dos trabalhos mais importantes publicados na literatura sobre o tema do projeto. Sugiro que o autor do projeto consulte estes trabalhos na íntegra e os conheça em profundidade, já que eles constituem uma síntese do que já se sabe sobre o assunto a ser pesquisado. Acredito cerca de 50 a 60% de todas as citações bibliográficas de um projeto devem ser dos últimos cinco anos. No tocante a citações bibliográficas, ressalto aqui o valor prático dos programas de citações bibliográficas dos quais trataremos adiante.

4) Objetivos: sugiro que o autor do projeto selecione no máximo três objetivos. Mesmo que outras conclusões possam ser feitas a partir dos dados experimentais obtidos, temos que solucionar de 1 a 3 objetivos que reputemos serem mais importantes e exeqüíveis de serem obtidos a partir dos materiais e metodologia experimental a ser definida na sessão seguinte.

5) Metodologia: a sessão metodológica deve ser extremamente detalhada, a meu ver. Aqui residem os principais pontos para crítica de um projeto. Antes de tudo, não podemos esquecer das considerações éticas, ou seja, o projeto deve ser aprovado por um comitê de ética em pesquisa da instituição em que vamos realizá-lo. No caso de estudos com seres humanos, precisamos também redigir um termo de consentimento livre e esclarecido que deverá também passar pelo comitê de ética em pesquisa institucional. Este termo deve: a) ser escrito de forma clara, compreensível para um indivíduo de nível educacional médio, sem jargão médico para explicar claramente no que consiste o tratamento experimental a que o indivíduo se submeterá; 2) ressaltar que a participação do indivíduo é voluntária e que há alternativas para seu tratamento caso se recuse a participar no estudo; 3) quais os efeitos colaterais e sintomas que ele pode esperar ao receber o tratamento experimental; 4) Como se comunicar com elementos do time de pesquisa caso surjam dúvidas ou efeitos adversos (telefones, bips, etc).

No tocante à sessão de métodos, para saber se uma dada informação pertence ou não a esta sessão eu sugiro que o autor do projeto imagine que este projeto deva ser inteiramente reproduzido por um outro grupo de pesquisadores sediados em um país distante sem facilidades para se comunicarem com ele. Então todas as informações que forem necessárias para que este outro grupo possa reproduzir o protocolo devem estar claramente contidas no projeto. Sugiro no projeto de pesquisa evitar a citação de outros trabalhos como um substituto a descrever a metodologia. Por exemplo, eu evitaria a frase: “ … e procederemos com a técnica X conforme descrita no trabalho de Jones e colaboradores.” Ao invés, eu descreveria a técnica X em detalhe e mencionaria depois desta explicação que esta técnica já foi utilizada de forma idêntica por Jones e colaboradores. Enquanto este expediente de referir o leitor para um trabalho anterior da literatura, ao invés de descrever a metodologia em detalhes pode ser muito útil para economizar espaço quando da publicação do trabalho, o leitor do projeto de pesquisa precisa estar tranqüilo que o autor do mesmo conheça muito bem a metodologia a ser empregada, o que pode ser demonstrado pela sua descrição detalhada no projeto. Estas considerações acerca da descrição detalhada da metodologia se aplicam, especialmente, aos métodos centrais do projeto de pesquisa, por exemplo, em um trabalho de estudo de um novo regime quimioterápico toda a ênfase da metodologia residirá sobre quais drogas foram ministradas, em quais doses, vias etc e não no método de dosagem da glicemia destes pacientes.

Devem constar na metodologia o número de pacientes a ser incluídos ou no caso de trabalhos experimentais o número de animais e as considerações estatísticas que expliquem o porquê da escolha deste número de sujeitos experimentais. No caso de pacientes quais os critérios de inclusão ou exclusão a serem seguidos para seleção de pacientes, quais as medicações e suas procedências, doses, periodicidade e vias de administração. Todas as substâncias químicas, linhagens celulares, equipamentos e quites utilizados devem ser discriminados quanto à sua nomenclatura oficial e procedência para que outros pesquisadores possam também adquiri-los se julgassem necessário. Todos os procedimentos devem ser detalhados para que pudessem com base nos dados fornecidos serem reprodutíveis de forma idêntica ao preconizado no protocolo.

Os métodos estatísticos assim como as hipóteses a serem testadas através destes métodos bem como os eventuais valores de corte utilizados para variáveis contínuas devem ser mencionados no protocolo, antes de se obterem os dados experimentais. Desta forma evitamos vieses na análise dos dados, pois sem estas precauções, poderia-se, de acordo com os dados obtidos, escolher arbitrariamente pontos de corte ou reformular hipóteses e mudar métodos estatísticos para se obter diferenças significativas que seriam falsas.

6) Dados preliminares: após a sessão metodológica, dados preliminares, se existentes,devem ser mencionados. Creio que todos os projetos de pesquisa devem ter dados preliminares pois sua presença atesta que a metodologia científica proposta já é dominada pelo autor do projeto. Acredito que dados preliminares robustos e uma metodologia primorosa são, ao lado de uma revisão da literatura adequada, os principais pontos a favor da aceitação de um projeto de pesquisa.

7) Referências bibliográficas citadas no texto no formato requerido pela ag6encia de fomento de pesquisa à qual se destinará o projeto. Caso não seja indicado um formato, sugiro o denominado Vancouver no qual as referências são citadas em ordem numérica no texto e colocadas nesta mesma ordem na bibliografia do artigo no formato exemplificado abaixo:

Grinspoon L, Bakalar JB. Marijuana: the forbidden medicine. London: Yale University Press; 1993

Mais detalhes acerca do formato Vancouver podem ser encontrados na página eletrônica:

http://www.nlm.nih.gov/bsd/uniform_requirements.html.

Um auxílio muito importante para colocação de referências bibliográficas no texto e sua posterior listagem na bibliografia são os programas específicos para manuseio de referências (“reference managemet softwares”) como o “Reference Manager”( http://www.refman.com/) e Endnote (http://www.refman.com/). Estes programas permitem “download”automático de referências da Internet (Pubmed) e sua inserção no texto que se está escrevendo, resultando em uma geração automática da lista de referências no final do artigo. As referências podem ser geradas no estilo Vancouver ou em dezenas de outros estilos automaticamente, sem a necessidade de se digitar nenhuma das referências. Estilos de citação das referências e de sua formatação podem também ser mudadas automaticamente. Estes programas são um enorme auxílio para os investigadores em todos os níveis que se dediquem a escrever projetos de pesquisa ou artigos cinetíficos.

8) Cronograma de trabalho: O cronograma do projeto deve mostrar para o leitor que no período em que se pretende realizar o projeto ele é plenamente exeqüível. Por exemplo, não podemos pleitear estudar 20 pacientes de uma doença rara que acomete dois pacientes novos por ano em dois anos, a não ser que nos associemos a outros centros de pesquisa. Costumo incluir no cronograma um número de meses (14 a 18) para coleta de dados, dois meses para análise e discussão dos mesmos e mais 2 meses para redação do trabalho final para publicação.

Um projeto de pesquisa para um projeto inicial de iniciação à pesquisa deve ter no máximo 20 páginas, sem contar os anexos. Uma para o resumo, 5 a 6 para a introdução, 4 a 6 para metodologia, 1 a 2 para resultados preliminares, 1 para cronograma e 2 a 3 para referências. Os anexos devem conter o termo de consentimento livre e esclarecido (no caso de um protocolo que envolva seres humanos) e, caso já tenha passado pelo comitê de ética em pesquisa (CEP) institucional, o termo de aprovação do projeto por esse comitê.

Cabe ainda aqui uma lista dos trabalhos principais e mais atuais já publicados pelo orientador do projeto na área de pesquisa (mesmo que já tenham sido citados nas referências bibliográficas), assim como um currículo resumido do orientador salientando suas principais publicações, alunos já orientados ou em processo de orientação. Se você ainda é um estudante universitário, um currículo associado ao formulário da faculdade contendo suas notas até o momento pode ser importante. Se você já for formado, seu currículo deverá também ser enviado. Podemos utilizar o currículo presente na plataforma Lattes do CNPQ (http://lattes.cnpq.br/index.htm) que certamente seu orientador já tem e que você deverá também criar para você, se você ainda não o fez. Estes dados visam demonstrar que o orientador está plenamente capacitado a orientar coce para realizar o projeto de pesquisa em questão.

O leitor interessado achará informações acerca do formato de projetos de pesquisa na página da FAPESP (http://www.fapesp.br/). Uma outra página excelente acerca de como se fazer um projeto é a da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (http://www.ufrgs.br/bioetica/projeto.htm).

CAPÍTULO 15 : DEZ DICAS PARA O USO MAIS EFICIENTE DO SEU TEMPO

“Em relação ao método de trabalho, eu tenho um pequeno conselho que dou com total convicção pela sua profunda influência em cada sucesso que tenha sucedido aos meus esforços na vida – não penses no amanhã. Viva não no passado nem no futuro, mas deixe que cada dia de trabalho absorva toda a sua energia e satisfaça suas maiores ambições” (William Osler. After twenty Five Years, in Aequanimitas).

Caro leitor, eis uma habilidade que lhe será útil por toda a vida. O tempo é um recurso finito e irrecuperável que requer um cuidado especial para não ser desperdiçado. A sua eficiência em cumprir metas de estudo ou trabalho em um dado período de tempo é um pressuposto do sucesso profissional, além de lhe propiciar períodos de tempo livres que serão essenciais para a convivência com seus familiares, férias e lazer. Tais períodos de descanso são essenciais para que você consiga ter eficiência no período de tempo que você dedica ao seu trabalho render. Há na literatura muitas dicas de como utilizar mais eficientemente o seu tempo e eu selecionei algumas que me são mais úteis para compartilhar com você. O leitor desejoso de mais informações sobre esta importante habilidade poderá consultar algumas páginas da Internet e alguns livros sobre o assunto indicados no final deste capítulo.

1) Estabeleça prioridades. Esta é uma dica fundamental. Stephen Covey, autor do famoso livro “7 hábitos das pessoas eficientes” sugere um esquema para classificar nossas atividades de acordo com sua importância e urgência Desta forma, ajudar sua esposa a ir para o hospital com dores de parto é uma tarefa urgente e importante e você deve parar tudo ajudá-la. Por exemplo, ir hoje à festa de aniversário de um primo distante pode ser uma tarefa urgente mas não importante. Por outro lado, estudar para uma prova final que ocorrerá daqui há 20 dias é uma tarefa importante mas não urgente enquanto que participar de uma reunião de confraternização daqui há 15 dias de um conhecido que lhe convidou apenas por cortesia pode ser classificada como uma tarefa não urgente e não importante. Devemos lembrar que a maior parte das tarefas ligadas aos nossos projetos de vida são do tipo importante mas não urgente. Entretanto, se estivermos sem um planejamento adequado, nos desorganizaremos e as datas limites de tudo o que reputamos ser importante se aproximarão, nos colocando diante de um grande número de tarefas importantes e agora urgentes, o que aumentará nosso nível de ansiedade. Nossa agenda deve, portanto, conter os compromissos importantes urgentes e não urgentes enquanto que devemos utilizar com sabedoria o “dizer não” para as tarefas não importantes, especialmente se não tivermos tempo para elas.

2) Conheça seu próprio ritmo circadiano, isto é, para algumas pessoas o período da manhã é mais produtivo, enquanto outras são notívagas. Tarefas mais árduas devem preferivelmente ser empreendidas no seu período de melhor rendimento.

3) Planeje com antecedência o uso de seu tempo de acordo com suas prioridades. Eu sugiro que se tenha sempre um plano mais amplo no qual se insiram compromissos marcados com antecedência como provas, reuniões, consultas médicas, atividade de consultório, etc. As lacunas de tempo no meio destes compromissos devem ter seu uso planejado com menos antecedência, isto é, na noite anterior ou mesmo cedo pela manhã. Desta forma podemos manter alguma flexibilidade para sempre tentar acomodar algo inesperado e de maior urgência nas lacunas de tempo préexistentes. O uso de agendas virtuais na internet ou de agendas eletrônicas em palmtops pode ser muito útil, pois permitem a utilização de alarmes e outros artifícios como lembretes para não esquecermos de tarefas importantes.

4) Estime o tempo que cada tarefa lhe tomará, reserve-o dentro de seu plano diário em um momento adequado de seu dia para realiza-la, de acordo com sua dificuldade. Saber estimar o tempo que cada tarefa lhe irá requisitar é muito importante para um bom planejamento do dia de trabalho. Não esqueça também de computar o tempo perdido com necessidades acessórias tais como, transporte, intervalos de descanso entre tarefas sucessivas,etc.

5)Nossa capacidade de concentração não é superior a 45 a 60 minutos. Portanto, estipule pequenos intervalos para descanso (10 a 15 minutos) entre períodos de cerca de 60 minutos, preferencialmente ininterruptos, alocados para realização de tarefas específicas e previamente agendadas. Não esqueça também de respeitar seu corpo não esquecendo dos períodos de sono, de alimentação, esporte e lazer.

6) Evitar interrupções. É obvio que você poderá ser interrompido por situações urgentes, isto é incontrolável. Entretanto, sugiro fortemente que você evite interrupções não urgentes como, por exemplo, usar a internet para checar e-mails ou conversar com amigos no meio de uma tarefa. Aloque períodos de tempo para tarefas tais como checar e-mails, telefonemas, etc em períodos nos quais você já não está com toda a sua disposição pois estas tarefas requerem geralmente menos concentração.Tente manter o foco em sua agenda ao máximo.

7) Evitar procrastinação, isto é, evite desculpas do tipo, amanhã eu pensarei nisso, começarei a estudar dois dias antes da provas, ninguém começou ainda a fazer o trabalho, etc. Faça tudo o que for alocado para hoje, hoje mesmo. Não procrastine, deixando para amanhã tarefas estipuladas para serem feitas ontem, pois você acumulará trabalho e isto poderá desistimulá-lo amnahã, estimulando-o a procrastinar e assim criar um ciclo vicioso de acúmulo de trabalho.

8) Organização é fundamental para a eficiência de nosso trabalho e certamente poupa tempo. Temos que ter tudo o que é necessário para desempenhar uma tarefa a mão antes de inicá-la, incluindo livros, artigos para consulta, dicionários, etc. O mesmo vale para a informação eletrônica cada vez mais frequentemente utilizada. Devemos ter tudo organizado em pastas em nosso computador que sejam facilmente acessíveis para que não percamos tempo procurando no computador onde está uma dada pasta contendo um dado arquivo no qual estamos trabalhando.

9) Procure começar pelo que é mais difícil. Se há alguma coisa rápida e fácil na lista de coisas a fazer, muitas vezes começo por ela e a elimino da lista e ao mesmo tempo me “aqueço” para poder me dedicar a seguir à tarefa mais difícil que exige maior atenção.

10) Leve em conta o imponderável em seu planejamento. Deixe sempre uma folga, especialmente para tarefas que têm data limite. Por exemplo se devemos entregar um trabalho num dado dia, tente aprontá-lo um dia antes. Procure trabalhar sempre com um ou dois dias de folga no seu agendamento, seta forma, imprevistos não modificarão seus planos já agendados anteriormente.

O leitor interessado encontrará mais informações úteis na página dedicada aos estudantes da Universidade de Buffalo (http://ub-counseling.buffalo.edu/studytime.shtml); na página de conselhamento para estudantes da Universidade de Illinois (http://www.couns.uiuc.edu/brochures/time.htm); na página para aconselhamento para alunos da Texas A&M University (http://www.scs.tamu.edu/selfhelp/elibrary/abc.asp ) e no excelente livro de Stephen R. Covey: Princípios essenciais das pessoas altamente eficazes. Editora Sextante, 2004.

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